terça-feira, 11 de outubro de 2011

Cuidado! Tratamento pode ser mais agressivo que o câncer.


O check-up em cheque



Cientistas americanos concluiram que a rotina de medir os níveis de PSA (proteína produzida por células da próstata) no sangue como forma de detecção precoce de câncer de próstata não salva vidas
Riad Younes


Mais uma vez, recomendações claras de poucos meses atrás se tornaram "não mais recomendáveis". Durante anos, exames periódicos eram rotineiramente incluídos em um sistema de check-up dirigido para melhorar a saúde das pessoas, e reduzir suas chances de morrerem de doenças evitáveis. A detecção precoce virou o foco da medicina. O raciocínio é muito simples, e lógico. Quanto mais precoce se detecta uma doença, ou um tumor, maiores seriam as chances de cura. Elementar.
Desde 1960, as sociedades médicas mundiais começaram a orientar os médicos e os cidadãos a seguirem protocolos e rotinas de exames. Dois destes exames foram contestados recentemente. Há dois anos, um grupo de cientistas e especialistas analisou com detalhes as evidências a favor do exame de mamografia para a detecção precoce de câncer de seio nas mulheres. O mundo médico ficou espantado quando este grupo concluiu que a mamografia rotineira em mulheres com menos de 50 anos de idade não trazia os benefícios desejados. E até poderiam levar a prejuízos de saúde. Foi um caos nos consultórios. As mulheres, e os médicos também, não sabiam mais o que fazer.
A mesma confusão se instalou na semana passada quando outro grupo de cientistas ligados ao governo americano (United States Preventive Services Task Force) concluiu que a rotina de medir os níveis de PSA (proteína produzida por células da próstata) no sangue como forma de detecção precoce de câncer de próstata não salva vidas da maneira divulgada até hoje. Ao contrário, os pesquisadores encontraram evidências de que milhões de pessoas foram submetidos a procedimentos médicos desnecessários, operações extensas, muitos ficando impotentes, ou com incontinência urinária, ou ambos.
Somente para lembrá-los, os melhores centros médicos do mundo observam incidência de impotência sexual ou incontinência urinária em 30% a 45% dos pacientes operados para a retirada da próstata. Não é um risco desprezível, principalmente se o benefício da cirurgia for colocado em dúvida. No dia seguinte do anúncio das recomendações novas desta Força Tarefa americana, um grande número de reclamações surgiu na mídia. Urologistas, associações de pacientes, e centros médicos protestaram de forma veemente contra o texto divulgado. No entanto, vozes mais atentas como a do Dr. O. Brawley, Diretor da Sociedade Americana de Câncer, orientam para que os resultados da Força Tarefa sejam examinados com detalhes, independente de conflitos de interesse pessoais ou de especialistas que trabalham nesta área da medicina.
Em nosso meio, a preocupação com os resultados limitados do rastreamento de câncer de próstata não é nova. Dr. Fernando Maluf, oncologista do Hospital São José, em São Paulo, especializado no tratamento de câncer de próstata, concorda com essas dúvidas e recomenda cautela na interpretação dos resultados publicados. Dr. Maluf acredita que "...o fato do rastreamento não ser perfeito para saber quais homens realmente têm a doença (evitando biópsias desnecessárias), aliado ao seu pequeno impacto na cura quando o tratamento precoce é realizado, indicam somente que precisamos melhorar tanto nossas ferramentas diagnósticas, quanto nossa seleção para escolher quais homens realmente precisam ser tratados em detrimento daqueles com tumores tão pouco agressivos cujos riscos do tratamento se sobrepõem aos riscos da própria da doença.
Este cenário deve melhorar muito nos próximos anos no sentido de aprimorar nossos diagnósticos e refinar o tratamento particularizando-o para cada situação. Novos testes sanguíneos e moleculares estão sendo estudados na tentativa suplantar o PSA e orientar com maior especificidade a necessidade de biópsias, além de escolher o melhor tratamento, que pode variar desde a simples observação com exames clínicos, PSA, e eventuais biópsias nos tumores pouco agressivos até cirurgia radical (acoplada em alguns casos até a radioterapia e hormonioterapia) em pacientes com tumores mais agressivos".
Enquanto isso não ocorre, valeria a pena cada indivíduo discutir a necessidade e a vantagem de se pedir o exame de PSA com intuito de detecção precoce de câncer de próstata. Converse com teu médico.

Riad Younes é professor Livre Docente da Faculdade de Medicina da USP. Médico do Centro Avançado de Oncologia do Hospital São José e do Núcleo Avançado do Tórax do Hospital Sírio Libanês, São Paulo. Especialista em câncer de pulmão. Foi Diretor Clínico do Hospital Sírio Libanês de março 2007 a março 2011.

Fonte: Portal Terra.com

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