O cavaleiro das trevas
Batman talvez seja o personagem mais complexo que já apareceu nos quadrinhos. São tantos conflitos (externos e internos) que não faltou material para o livro Batman e a Filosofia, publicado pela editora Madras.
Batman talvez seja o personagem mais complexo que já apareceu nos quadrinhos. São tantos conflitos (externos e internos) que não faltou material para o livro Batman e a Filosofia, publicado pela editora Madras.
Como sempre faço com os
títulos dessa coleção, começo a ler os artigos que me chamam mais atenção.
Nesse caso foi especialmente difícil escolher, porque todos os assuntos
pareciam bastante interessantes. São questões deliciosamente divertidas como “A
loucura do Coringa – O príncipe palhaço pode ser considerado moralmente
responsável?”,
“Bruce Wayne deveria
ter se tornado Batman?”, “Batman poderia ser o Coringa” ou “Por que Batman é
melhor do que Super-Homem?”. Escolhi então uma questão que sempre me passou
pela cabeça.
Por
que Batman não mata o Coringa?
Qualquer fã daria uma
resposta rápida a essa questão. O Cavaleiro das Trevas jurou não matar para não
se equiparar aos criminosos que caça pelas noites de Gotham. O artigo de Mark
D.White discute a questão sob a visão de dois conceitos filosóficos: o
utilitarismo e a deontologia.
Pense bem, matar o
Coringa não teria evitado centenas de mortes? Esse é um raciocínio típico do utilitarismo, um sistema de ética que
requer a maximização da felicidade total ou do bem-estar resultante de nossas
ações. Ou seja, uma forma de consequencialismo, onde se avalia uma ação
unicamente em função de suas consequências.
Os heróis de quadrinhos
normalmente não são utilitaristas, pois para eles existem certas barreiras que
não podem ser transpostas. Assim, eles não matam mesmo que o motivo seja salvar
muitas outras vidas. No utilitarismo isso não tem sentido. Seria como dizer que
Batman está permitindo que muitas pessoas morram porque ele não quer matar
apenas uma. O autor cita uma frase de Jason Todd questionando a decisão de
manter o Coringa vivo que ilustra bem isso. “Eu pensei que quando ele me
matasse – que eu seria a última pessoa que você o deixaria ferir”.
Se no utilitarismo a
solução mais fácil seria acabar de vez com a vida do vilão, na deontologia esse ato seria inaceitável.
Nessa doutrina ética, a moralidade dos atos está nas suas próprias
características e não nos seus resultados. Ou seja, os fins não justificam os
meios e o meio deve ser justificado por seus próprios méritos. Assim, matar o Coringa
é um ato moralmente condenável porque matar é errado e isso independe dos
resultados futuros desse ato. Isso explica a visão de Bruce Wayne, concorda?
O
Bonde do Batman
Para ilustrar esse
dilema, White utiliza o “problema do bonde” dilema filosófico elaborado por
Judith Jarvis Thompson. Imagine um bonde em movimento. Nos trilhos estão cinco
pessoas que não estão ouvindo o som dele se aproximando e não há tempo para
pará-lo ou avisar as pessoas para saírem da frente. A única solução é desviá-lo
para um outro trilho. O problema é que nesse outro caminho também existe um
homem parado que não conseguirá escapar. Imagine então que existe um observador
ao lado da alavanca de mudança dos trilhos. Ele deve fazer uma escolha: não
fazer nada ou agir e desviar o bonde, causando a morte de uma pessoa.
Imagine agora Bruce
Wayne. Ele é o cara da alavanca. De um lado cinco inocentes e do outro o
Coringa. A escolha fica mais fácil, não é? A diferença para o “problema do
bonde” é que conhecemos o antecedente moral de um dos envolvidos, o que talvez
facilitasse a escolha da solução a ser tomada. “Afinal de contas, por que as
vítimas dele deveriam se sacrificar para que ele vivesse – principalmente
quando lembramos que ele vive para matar pessoas inocentes?”.
Pré-punição
Analisando o exemplo
acima, vemos que a opção de matar o Coringa é baseada na suposição que isso
evitaria mortes futuras. Mas como afirmar isso? Será que aquela não poderia ser
sua última vítima? O fato é que não é possível ter certeza absoluta que ele matará
novamente, logo também não é possível afirmar que estamos salvando qualquer
vida com sua morte. Ok, o cara tem antecedentes que falam por si só. Mas
podemos dar um fim nele sem saber se vai voltar a matar?
Punir as pessoas antes
que elas cometam um crime corresponde a pré-punição, conceito que se tornou
famoso com The Minority Report, conto de Philip K.Dick e sua posterior
adaptação para o cinema. Aí complica!!! Quem defende que o correto é matar o
Coringa, alega que o vilão não deixa dúvidas que vai voltar a agir, o que
elimina a possibilidade pré-punição. Os que defendem que é moralmente errado
matá-lo podem afirmar que, por mais que seja improvável, o palhaço do caos pode
se arrepender e não mais praticar crimes e é por respeito a essa possibilidade de
escolha que não devemos pré-punir.
E
qual a sua conclusão?
Felizmente para os fãs,
Batman dificilmente mataria o Coringa (e vamos combinar, se matasse um tempo
depois a DC ia ressuscitar). Ele já teve diversos motivos e oportunidades,
sendo que sempre conseguiu manter seus valores morais intactos.
Deixo como conclusão,
uma citação ao próprio artigo:
“Se dissermos ao
Cruzado Encapuzado, como muitos o fizeram: “Se você não matar o Coringa, as
mortes de todas as futuras vítimas dele estarão em suas mãos”, ele poderia
responder muito bem responder “Não, as mortes que o Coringa causa são
responsabilidade dele, e apenas dele. Só sou responsável pelas mortes que eu
provoco”. Esse é outro modo de encarar a regra agente-centrado que discutimos
antes: o observador no exemplo do bonde poderia afirmar: “Não fui eu quem fez
com que o bonde colocasse a vida das pessoas em perigo, mas eu causaria a morte
de uma pessoa se o desviasse”.
Texto
acima de (Kitty
Prado)
COSMOVISÕES
SUBJACENTES
Ausência
de Sobrenatural
Batman é um super-herói
diferente. É um herói sem poderes sobre-humanos. Não sofreu nenhuma mutação,
não veio de outro planeta, é repleto de cicatrizes, tem crises psicológicas,
sofre por um amor não resolvido e é perseguido pelo “fantasma” da perca prematura
dos seus pais (determinante em quase tudo em sua vida).
Ele não somente ajuda
os policiais como também é salvo por eles. Suas virtudes são exclusivamente
humanas. Especificamente, são virtudes intelectuais e físicas (e.g., habilidade
nas investigações, grande aptidão em artes marciais e, sem máscara, um
excelente homem de negócios). Podemos dizer que Batman é o legítimo e
verdadeiro Super-Homem. Por isso é o herói “mais próximo” do seu público.
Essa característica tão
marcante do homem-morcego, ignorada por Joel Schumacher em Batman e Robin
(1997) foi reverenciada e levada às últimas consequências por Christopher Nolan
(diretor) em BCT. Para Nolan, realidade significa ausência do sobrenatural.
Isso foi evidenciado em sua tentativa de evitar o uso de recursos
computadorizados. Seu objetivo é evitar, ao máximo, no espectador, o
referencial de ficção. Não é a toa que todas as explosões são reais.
Uma das cenas
grandiosas do filme é a destruição do hospital de Gotham. Aqui Nolan não fez
qualquer manipulação de imagem. Um prédio real foi destruído. No filme, é
Ledger (Coringa) que aciona os explosivos. Foi exatamente isso que aconteceu.
Outro exemplo se dá com
os equipamentos do Batman. Todos são reais. Sua moto, assim com sua armadura,
realmente existem e podem ser utilizadas na prática. Essa busca contumaz por
uma maior realidade determinou o custo do filme (180 milhões de dólares) bem
como a rejeição de alguns personagens como Pingüim. Para Nolan, o Pingüim
destoava do universo realista dessa série.
A realidade (ausência
do sobrenatural) do Batman também pode ser vista em suas limitações. Em uma das
cenas primorosas do filme, o Coringa coloca Batman em um dilema: ou ele
salvaria a vida de sua amada (Rachel) ou a vida do promotor público (Dent).
Revelando as limitações do herói, o Piadista afirma: “Você não pode fazer nada
com toda sua força”. E realmente Batman não consegue. Aliás, ele não consegue
salvar nenhum deles.
Um dos efeitos dessa
busca pela realidade (sem sobrenatural) é nos aproximar do herói, sua história,
seus sentimentos, bem como seus ideais. A priori se você tem uma boa saúde,
muito dinheiro e um ideal, você também pode ser um Batman. Porém, como ele, não
resolverá todos os dilemas da vida.
Moral
e Ética
Os heróis convencionais
seguem as regras. Eles não mentem (geralmente omitem), não invadem a
privacidade de trinta milhões de pessoas e não torturam. Não é assim com o
Batman. É fato que há certo e errado em BCT. Em outras palavras, há moral para
o Cruzado Encapuzado. Porém, isso não é o mesmo que seguir a ética vigente.
Ética e moral são distintos. O primeiro pode ser mudado e violado enquanto o
segundo deve ser obedecido.
Batman vai além do
conceito convencional de herói. Segundo o filme, ele é melhor que um herói. A
obra deixa patente que ser herói não basta. Ele é o agente do bem, mas não pode
estar preso às amarras da ética. Alfred, seu mordomo e conselheiro, afirma que
Batman é a única pessoa que pode tomar a decisão correta, pois ele está além da
lei, ele não responde à lei, ele está “nas trevas”.
Para BCT, a verdade e o
legal são utópicos. Apesar de existir certo e errado, sua aplicação é irreal.
Alguém tem que se sacrificar. Alguém que não está preso às amarras da ética
convencional. Em sua carta de despedida, Rachel, amiga e amada por Batman,
afirma: “O mundo vai sempre precisar do Batman”. Respeitando o contexto da
declaração, ela quis dizer que nunca vai surgir um herói “sem máscaras” que
siga as regras plenamente – um cavaleiro branco.
Como todo homem sem
referencial fora de si mesmo, Batman tem suas próprias regras. Tem moral, mas é
ele quem a determina. Sua ética não é baseada em um senso moral a priori
(infinito e universal). “[…], a posição moral de Batman se origina de uma
apreciação da complexidade do comportamento humano e das formas extremas que
ele pode assumir” 9. Sua única regra é não matar. Porém, essa regra está ligada
a sua experiência de orfandade prematura e traumática.
A postura de Batman
lembra o viver autêntico do existencialismo de Martin Heidegger.10 Segundo o
Coringa, poucos se encaixam nessa categoria. Batman e o próprio Coringa seriam
um desses. Um (Batman) escolheu combater o crime, o outro (Coringa) escolheu o
cinismo e a loucura. A máfia bem como a polícia, por outro lado, são “idiotas”
(palavras do Coringa) porque, como a grande maioria, é escrava do sistema.
Segundo Joker (Coringa), “o código de honra deles é uma piada (joke) ruim”.
A tese do Coringa é que
as pessoas são tão boas quanto o mundo (sistema) permite. Não há uma regra
universal. No primeiro sinal de problema ou pressão, o ser humano abandona seus
códigos éticos. Se o sistema permitir, diz o Coringa, as pessoas devorariam
umas as outras. “Anomalias” como Batman e Coringa seguem sua “vida autêntica”.
A diferença, afirma o Coringa, é que agora o sistema precisa do Batman, por
isso o aceita, mas logo o expulsará como a um leproso. Para o Piadista (Joker)
sua rejeição se dá por estar na vanguarda. Ele está além do Batman. O
homem-morcego ainda está preso às regras. E para o Coringa, o único jeito de
viver de uma forma sensata é não ter regras.
Há certa indefinição
e/ou incoerência na postura moral do Batman. Ora ele parece ser um
deontologista11 quando não somente não consegue matar o Coringa [talvez sua
única regra] como também o salva e luta com a culpa de mortes que não foi o
responsável direto;12 ora é um perfeito adepto do pragmatismo e/ou utilitarismo
quando se sacrifica sendo odiado escolhendo a mentira como consolo para o povo.
Batman é um enigma entre o mocinho e o ladrão, entre o que é correto fazer e o
que é, de certa forma, ilimitado pela maldade, crueldade ou o desejo de
realizar, pelo mal, o inimaginável. Ele faz o que é moralmente certo, mas “nas
trevas”, ou seja, é um fora da lei.
Pessimismo
A realidade e
proximidade do Batman para com o ser humano não são moldadas pelo romantismo do
modernismo. Por mais que o herói seja inteligente, hábil fisicamente, possua
ideologia e seja um dos homens mais ricos do mundo, ele não resolve tudo.
Aliás, ele não consegue resolver seus próprios problemas.
O objetivo do herói do
filme é dos mais nobres: inspirar o bem. No entanto, sua existência atrai
criminosos cada vez mais loucos como o Coringa. Com toda sua força o herói
perde sua amada, e, nas palavras do promotor Dent (aprovadas pelo próprio
Batman), ele não passa do produto da indiferença e/ou crítica do povo. Aquele
em quem Batman aposta suas fichas para ser o verdadeiro herói de Gotham, o
herói sem máscara e seguidor da lei, acaba se tornando um criminoso – chamado
posteriormente de Duas Caras.
O pessimismo não está
presente somente no insucesso de Batman, mas na relação de dependência
ontológica entre o bem e o mal na qual Batman e Coringa estão presos e são seus
estereótipos. O filme coloca o bem como uma resposta ao mal, enquanto o mal só
existe porque há o bem para combatê-lo. Coringa diz para Batman: “Eu te matar?
Eu não quero te matar, você me completa...”. Em outro diálogo Coringa diz:
“acho que nós dois estamos destinados a fazer isso para sempre”.
Batman é um homem
tentando resolver os problemas do seu povo. Porém, sem sucesso. O Coringa é um
louco, autodenominado agente do caos, que tem seus planos, ora são realizados
com sucesso, ora são frustrados. Batman e Coringa representam a luta sem fim
entre bem e mal.
Há uma máxima que
sintetiza o filme. Ela aparece tanto no início como no fim da obra. Primeiro na
boca do promotor público (Harvey Dent), posteriormente pela boca do próprio
Batman. Segue: “Ou você morre herói ou vive o bastante para ver você mesmo se
tornar vilão”. Esse aforismo é realizado tanto na vida do promotor que começa
como a grande solução para Gotham e se torna um assassino movido pela vingança
e termina com Batman que assume os crimes que não cometeu para manter a imagem
do promotor. Ou seja, se alguém planeja fazer o bem, só poderá morrer herói se
morrer cedo, caso contrário, se tornará um vilão (pela prática ou pela
reputação). É uma questão de tempo. Nada mais pessimista.
Esperança
Existencialista
Se a eternidade é
cíclica e o mal e o bem sempre existirão, o que fazer, então? Batman prefere a
fé (esperança) na mentira do que a verdade que não produz esperança. Segue seu
último diálogo no filme logo após a morte do símbolo de esperança – o promotor
Harvey Dent denominado “Cavaleiro Brilhante”:
– As pessoas vão perder
a esperança (Comissário Gordon).
– Não vão não. Eles
nunca vão saber o que ele fez (Batman).
– Cinco mortos. Dois
policiais. Não se pode varrer isso (Gordon).
– Não. O Coringa não
pode vencer. Gotham precisa de um herói de verdade (Batman).
– Não. (Gordon)
– Ou você morre herói
ou vive o bastante para ver você mesmo se tornar vilão. Eu posso ser as duas
coisas. Porque não sou herói. Não como Harvey. Eu matei aquelas pessoas. É o
que sou (Batman).
– Você não é (Gordon).
– Eu sou o que Gotham
precisar […] Às vezes a verdade não basta. As pessoas merecem mais. Às vezes as
pessoas merecem ter sua fé recompensada. (Batman).13
Destaque para sua
última declaração. Para Batman, a dura realidade de uma vida sem esperança pode
ser substituída pela mentira (aqui no caso não é o mesmo que omissão). Para o
Cavaleiro das Trevas, a recompensa para fé é a realização da mesma, mesmo que
seja um embuste. O que não se pode é parar de esperar. A mentira é um mal menor
diante da falta de esperança. Nesse mundo de injustiças o povo precisa acreditar.
É isso que move as pessoas.
MOMENTOS
DE VERDADE
Os
Limites da Justiça Humana
Em Eclesiastes 3:1-15
nos assegura que Deus tem um plano grandioso que abarca todos os homens e suas
ações em todo o tempo. O homem não decide o seu nascimento e uma vez vivo
descobre que pode morrer e ele não decidiu isso. O mesmo acontece com os
vegetais. É Deus quem controla todas as coisas. Nesse mesmo contexto o autor
nos revela que Deus colocou a eternidade no nosso coração sem dá condições de
resposta sobre o princípio e o fim. Precisamos de Deus, precisamos de Sua
revelação sobre a vida, os valores, o certo, o errado e o bem. Em 3:16-4:16 o
autor apresenta algumas anomalias e aparente contradições que podem ser
implicadas do que acabou de assegurar: o controle de Deus. O verso 11 diz que
Deus fez tudo “formoso”. Mas, o verso 16 diz: “Vi ainda debaixo do sol que no
lugar do juízo reinava a maldade e no lugar da justiça, maldade ainda”.
O Pregador observa que
aonde deveria ter justiça encontramos maldade. Diante desse quadro aonde lançar
nossas esperanças? O texto responde: “Então, disse comigo: Deus julgará o justo
e o perverso; pois há tempo para todo propósito e para toda obra” (3.17). Em
outras palavras, não justiça plena enquanto o homem for seu único agente.
O filme revela as
limitações que a lei (queda) impõe na aplicação da justiça “maior” (criação).
Não dá para fazer o certo estando “preso” à lei. Por duas razões: as limitações
da própria lei bem como as limitações dos que a aplicam (queda). Usando a
terminologia do filme, é preciso fazer a justiça “nas trevas”.
A constatação de que
não se alcança verdadeira justiça pela força do homem é correta (queda). Não
são poucos os que procuram justiça nos meios convencionais e experimentam
frustração. Esperar pela justiça “dos homens” é esperar demais. O grande
diferencial se dá em como devemos reagir diante de tal constatação (redenção).
Aqui os cristãos se separam tanto do Coringa quanto do Batman. Os cristãos
confiam em Deus. Romanos 12.19 é claro: “…não vos vingueis a vós mesmos,
amados, mas dai lugar à ira; porque está escrito: A mim me pertence a vingança;
eu é que retribuirei, diz o Senhor”. Além disso, o reconhecimento das
limitações das leis não nos impelem a aceitar tudo da lei.
O herói das trevas,
como nos mitos antigos, não deixa de ser (ou querer ser) um deus que resolve
tudo com suas próprias mãos (queda). Como cristãos, ficamos com a constatação,
porém mudamos na reação. Lutamos reconhecendo nossas limitações esperando que
no final a justiça plena venha por meio de Deus (redenção).
Tendência ao mal
Antes de adentrar ao assunto, faz-se necessário descrever uma cena crucial: O Coringa coloca explosivos em duas barcas. Em uma delas estão “civis inocentes” (terminologia do filme), em outra, somente presos (condenados por roubo, morte etc.). O detonador dos explosivos da balsa dos presos ficou no poder dos cidadãos comuns enquanto o detonador dos explosivos da balsa dos “inocentes” ficou com os prisioneiros. O Coringa orienta ambas as balsas de que às 00:00h ele vai explodir ambas caso uma delas não esteja já destruída. Ou seja, o barco que destruir o outro, estará livre. A hora chega e nenhum barco destrói o outro. Diante desse quadro Batman diz ao Coringa: “O que você quer provar? Que lá no fundo todos são podres [ugly] como você? Só você é podre […] “Essa cidade acabou de mostrar que está cheia de pessoas que só acreditam no bem”14.
O fato é que o Coringa
nesse ponto está certo. A maioria do barco dos “civis inocentes” decide por
explodir o outro barco. E no barco dos presidiários, um grupo decide matar o
responsável pelo barco para explodir o outro. Ambos os barcos querem explodir o
outro, mas, ou não têm coragem (o barco dos “inocentes”) ou falta oportunidade
(o barco dos condenados). Não faltou vontade (desejo), faltou coragem e
oportunidade.
Em resposta ao Batman,
o Coringa afirma que o espírito da cidade não se corrompeu completamente ainda,
mas quando souberem dos atos “heroicos” do promotor (assassinou cinco pessoas)
as cadeias vão ficar cheias. Ele (Coringa) colocou Harvey Dent no mesmo nível
dele e do Batman. Ele agora fazia parte do grupo dos fora da lei. Segundo o
Coringa, isso não foi difícil.
Batman no fundo
acredita no Coringa, por isso escolhe mentir sobre o Harvey assumindo seus
crimes. Ele sabe que, no fundo, o povo vai se rebelar ao saber que o promotor,
a esperança de Gotham, é um assassino. Essa é a tendência da humanidade. Nas
palavras do Coringa: “A loucura é como a gravidade, basta um empurrãozinho”. Se
o sistema permitir, afirma o piadista, “as pessoas civilizadas comerão umas as
outras”.
Respostas
Bíblicas para Algumas Questões
O
Sistema e o Indivíduo
No filme a população ou
a “massa” muda de acordo com as condições. Apoia o Batman, no entanto, logo
após o Coringa começar a matar pessoas ameaçando não parar até a revelação do
mascarado, todos queriam a revelação de sua identidade; o que significava o fim
de sua vida de herói e o começo de uma vida de prisioneiro.
Segundo o Coringa:
“Loucura é como a gravidade, basta um empurrãozinho”. O Coringa defende a ideia
de uma influência determinante do sistema nos indivíduos. Para ele, se
colocarmos (e isso inclui o sistema) as pessoas em situações de tensão que elas
revelarão quem realmente são – loucas e sem moral. Isso fica claro quando
afirma que “as pessoas são tão boas quanto o mundo (sistema) permite”. O
próprio Batman acredita nisso, quando no final do filme entendeu que a mentira
sobre uma instituição (promotoria pública) era o melhor para o povo.
A perspectiva
Teo-referente, por outro lado, assegura que nossa cosmovisão é o produto do
nosso coração pecaminoso e apóstata somado às estruturas psíquico-sociais e
histórico-culturais (e.g., educação [formal, e principalmente familiar nos
primeiros anos de vida], cultura regional, relacionamentos, meios de
comunicação). O relacionamento dessas duas nuanças (interna e externa) da
construção da cosmovisão humana deve ser entendido como camadas sobrepostas. O
coração (substrato interno da existência humana) é a matriz primordial seguida
das camadas supracitadas.
Pressupondo uma
antropologia bíblica, o homem, devido ao pecado, consequentemente, não
interpreta a vida de forma neutra ou vazia como se fosse, nas palavras do
empirista inglês John Lock, uma tabula rasa. Pelo contrário, o coração humano é
religioso por natureza e após a queda esse coração continua sendo para-Deus,
porém em rebelião.
As Escrituras nos
revelam que essa esfera ou dimensão que chamamos de “coração” é a mais profunda
do nosso ser (self), e por isso, inacessível a toda forma de análise ou
procedimento de sondagem empírica (cf. Sl. 139.23, 24; Jr. 17.10). O acesso só
se dá pela Palavra através do Espírito (1Co 2.13-15; Hb 4.12). A mudança
radical de uma cosmovisão, portanto, é o que a Escritura chama de “regeneração”
(Jo 3.3,4; Tt 3.5).
Em síntese, o sistema
tem seu papel na formação das cosmovisões, porém não é determinante. Caso
aceitássemos tal postulado eliminaríamos a culpa do indivíduo. “A idolatria [no
sentido de pecado] é um problema profundamente enraizado no coração e
poderosamente impingido sobre nós pelo ambiente social”15. A complexidade do
ser humano não permite que façamos declarações como as que o Coringa fez. Nossa
tendência, sim, é para o mal. Mas como ele se revelará é outra história. O mal
não tem só uma cara (Cl 2.23; 2Co 5.12; 2Co 11.14).
O
bem e o mal
Muitas são as propostas
que têm se levantado diante da problemática do bem e o mal – sua existência,
origem, relação com Deus e entre si. Alguns têm diminuído o poder de Deus
(teísmo aberto); outros versam que o mal não passa de uma ilusão (Budismo), o
que gera outro problema: a ilusão do mal. Outros adotam a visão do Coringa. Entendem
o bem e mal como entidades de dependência ontológica. O filme (através do
Coringa) assegura que o bem como uma resposta ao mal, enquanto o mal só existe
porque há o bem para combatê-lo. Coringa diz para Batman: “Eu te matar? Eu não
quero te matar, você me completa...”16
Para os reformadores o
mal é definido como privatio actuosa. O ponto aqui é que o mal não pode existir
em si e de si mesmo. Ele depende da corrupção do bem. A relação de dependência
seria equivalente à do ferro e a ferrugem. O primeiro não depende do segundo
para existir, mas o contrário é fato.
A incoerência de
Coringa é facilmente refutada. Se o bem depende do mal, o mal passa a ser um
bem encoberto. “Mas o mal do qual Deus extrai o bem é um mal verdadeiro. Da
traição cometida por Judas contra Jesus vem o ato redentor da cruz, mas isso de
forma alguma minimiza a perversidade do ato de Judas”.17 Nessa concepção, para
experimentar bem, o próprio Deus deveria experimentar o mal.
Fonte:
Teologiabrasileira.com
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