terça-feira, 28 de maio de 2013

O Processo(Franz Kafka) - Reflita sobre isso e veja que terrível drama para àqueles que cai nas garras da burocracia

"Diante da lei, há um guarda.
Um homem vem do interior, pedindo para entrar.

Mas o guarda não pode deixá-lo entrar.
Ele pergunta se pode entrar mais tarde.
- É possível. Diz o guarda.
O homem tenta olhar, aprendeu que a lei foi feita para todos.
- Não tente entrar sem a minha permissão, sou poderoso apesar de ser o menor dos guardas, e a cada sala e porta haverá um guarda mais poderoso que o anterior. Diz o guarda.
Com a permissão dada o homem senta ao lado da porta e espera.
Espera durante anos.
Ele vende tudo o que tem, na esperança de subornar o guarda.
O guarda aceita para que o homem não sinta que não tentou.
Fazendo vigília ao longo dos anos o homem conhece até as pulgas no colarinho do guarda.
Ficando gagá com a idade ele pede às pulgas que convençam o guarda a deixá-lo entrar.
Sua visão é curta, mas, na escuridão ele percebe um brilho imortal na porta da lei.
E agora, antes de morrer, toda a sua experiência se concentra
em uma única pergunta que nunca fez.
Ele chama o guarda que pergunta:
- O que você quer?
O homem diz:
- Todos lutam para ter lei, então porque em todos aqueles anos ninguém pediu para entrar?
A audição do homem não é boa, e o guarda grita em seu ouvido:
- Só você poderia entrar, ninguém passaria por essa porta, esta porta foi feita somente para você, agora eu a fecharei."



Franz Kafka (O Processo) Fragmentos

Original


Diante da Lei há um guarda. Um camponês apresenta-se diante deste guarda, e solicita que lhe permita entrar na Lei. Mas o guarda responde que por enquanto não pode deixá-lo entrar. O homem reflete, e pergunta se mais tarde o deixarão entrar. “É possível” , disse o porteiro, “mas não agora”. A porta que dá para a Lei está aberta, como de costume; quando o guarda se põe de lado, o homem inclina-se para espiar. O guarda vê isso, ri-se e lhe diz: “Se tão grande é o teu desejo, experimenta entrar apesar de minha proibição. Mas lembra-te de que sou poderoso. Eu sou somente o último dos guardas. Entre os salões também existem guardas, cada qual mais poderoso que o outro. Já o terceiro guarda é tão terrível que não posso suportar seu aspecto”. O camponês não havia previsto estas dificuldades; a Lei deveria ser sempre acessível para todos, pensa ele, mas ao observar o guarda, com seu abrigo de pele, seu nariz grande e como de águia, sua barba longa de tártaro, rala e negra, resolve que mais lhe convém esperar. O guarda dá-lhe um banquinho, e permite-lhe sentar-se a um lado da porta. Ali espera dias e anos. Tenta infinitas vezes entrar, e cansa ao guarda com suas súplicas. Com freqüência o guarda mantém com ele breves palestras, faz-lhe perguntas sobre seu país, e sobre muitas outras coisas; mas são perguntas indiferentes, como as dos grandes senhores, e para terminar, sempre lhe repete que ainda não pode deixá-lo entrar. O homem, que se abasteceu de muitas coisas para a viagem, sacrifica tudo, por mais valioso que seja, para subornar o guarda. Este aceita tudo, com efeito, mas lhe diz: “Aceito-o para que não julgues ter omitido algum esforço”. Durante esses longos anos, o homem observa quase continuamente o guarda: esquece-se dos outros, e parece-lhe que este é o único obstáculo que o separa da Lei. Maldiz sua má sorte, durante os primeiros anos temerariamente e em voz alta; mais tarde, à medida que envelhece, apenas murmura para si. Retorna à infância, e, como em sua longa contemplação do guarda, chegou a conhecer até as pulgas de seu abrigo de pele, também suplica às pulgas que o ajudem e convençam ao guarda. Finalmente, sua vista enfraquece-se, e já não sabe se realmente há menos luz, ou se apenas o enganam seus olhos. Mas em meio à obscuridade distingue um resplendor, que surge inextinguível da porta da Lei. Já lhe resta pouco tempo de vida. Antes de morrer, todas as experiências desses longos anos se confundem em sua mente em uma só pergunta, que até agora não formulou. Faz sinais ao guarda para que se aproxime, já que o rigor da morte endurece seu corpo. O guarda vê-se obrigado a baixar-se muito para falar com ele, porque a disparidade de estaturas entre ambos aumentou bastante com o tempo, para detrimento do camponês. “Que queres saber agora?”, pergunta o guarda. “És insaciável”. “Todos se esforçam para chegar à Lei”, diz o homem ; “como é possível então que durante tantos anos ninguém mais do que eu pretendesse entrar?”. O guarda compreende que o homem já está para morrer e, para que seus desfalecentes sentidos percebam suas palavras, diz-lhe junto ao ouvido com voz atroadora: “Ninguém podia pretender isso, porque esta entrada era somente para ti. Agora vou fechá-la”.



Franz Kafka(O Processo)

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